
O mínimo que se pode dizer dos relatos que o Canal Benfica faz dos jogos do clube lisboeta é que são desconcertantes. Ao longo de hora e meia, um narrador e um comentarista sentam-se com um televisor em frente e vão relatando para a câmara o que está a acontecer no campo onde joga o Benfica. Lá atrás, colocado de forma que os espectadores tenham uma ideia das imagens mas nem por isso o seja violada a exclusividade de direitos, outro ecrã está sintonizado no canal que efectivamente transmite o jogo. E, entretanto, narrador e comentarista vão descrevendo os acontecimentos em jeito de rádio local em dia de competições europeias: de forma perfeitamente amadora e gritando em delírio os golos do “Glorioso”, enquanto apenas sussurram os golos do adversário.
Se lhe chamo desconcertante, é porque não sei sequer dizer se o modelo é bom ou é mau. Quer dizer: é claramente mau. Por outro lado, é tão claramente mau que, no limite, pode ser também um interessante exercício sobre as potencialidades e as limitações da televisão, esse meio hoje tão heterogeneizado que dois terços dos seus fenómenos podem sempre ser abrigados sob o guarda-chuva do “experimentalismo”. Facto: os relatos do Canal Benfica podiam muito bem ser uma invenção de uma estação local transmitida pela Internet; e também podiam ser um programa da SIC Radical, caso em que teriam efectivamente muita graça.
De maneira que, antes de decidir, mais vale passar por lá este domingo. Se o Benfica ganhar 5-0, serão cinco as oportunidades de ver aqueles dois homens aos gritos delirantes. Se perder, então é provável que assistamos a uma sucessão de afrontamentos em directo. Em qualquer dos casos, far-se-á História.
CRÍTICA DE TV ("Crónica TV"). Diário de Notícias, 6 de Maio de 2010