
De todas as sugestões e reclamações que vou recebendo a propósito desta coluna, o tema mais recorrente é talvez o dos alinhamentos dos telejornais. Para muitos espectadores, a forma como as notícias se sucedem não faz sentido. Os serviços noticiosos, reclamam, são capazes de abrir com desporto, passar ao nacional, saltar para o internacional, voltar ao nacional, tornar ao desporto, alternar temas do dia e fait divers algures pelo meio – e muitas vezes, ao fim do jornal, ninguém percebeu ainda o que é decisivo, o que é importante e o que é curioso.
O método tem uma justificação: ao contrário dos leitores dos jornais, que regra geral são metódicos e procuram “navegabilidade”, os espectadores de TV são impacientes e implacáveis, mudando de canal à mais pequena desaceleração de tom. Naturalmente, os leitores de jornais e os espectadores de TV são muitas vezes as mesmas pessoas. Mas a mudança de registo transforma-lhes a personalidade – e um telejornal que não lhes injecte adrenalina a cada dois minutos, provocando-lhes uma vertigem imediatamente a seguir a pô-los a pensar, jamais vingará em sede de share.
Pode-se perguntar se isso é jornalismo ou espectáculo. Talvez seja um pouco de ambos. Mas é jornalismo, com certeza. Nos tempos que vivemos, e em parte devido aos modelos de comunicação que a Internet desenvolveu, o consumidor de informação é muito mais um respigador do que um cliente habitual – e ao jornalismo passou entretanto a impor-se a necessidade de espalhar estrategicamente a informação, de forma a que ele tropece nela. Sem tropeçar, hoje em dia, ninguém se senta no sofá. Não para inteirar-se do estado do mundo. Que interesse teria isso?
CRÓNICA DE TV ("Crónica TV"). Diário de Notícias, 12 de Abril de 2010