Quando estreou em França, em 2007, Segredos (Cada Mulher Tem Um Segredo) (Suspectes: Chaque Femme A Un Secret, no original), produzida pela M6, foi quase um happening: uma importante declaração de vitalidade por parte da ficção televisiva francesa. Daí que haja algo de interessante em vê-la agora exibida diariamente na RTP1, ainda por cima num horário que, sendo late night (01:00), não deixa de torná-la acessível ainda a muita gente, até porque o padrão dos horários laborais se alterou nos últimos anos.
E, no entanto, são muitos os defeitos. A realização é relativamente ágil, a banda sonora resulta bastante bem, o ritmo funciona. Mas as actrizes são fracas, os diálogos são pobres, o dilema é demasiado batido, as personagens também – e, sobretudo, a intriga é mal gerida, lançando pistas nos momentos errados, atando nós que depois se esquece de desatar e acorrendo a demasiados clichés do género para conseguir conservar o interesse do início ao fim de um só episódio.
“Deus está nos pormenores”, diz a velha frase de van der Rohe – e o facto é que, quando se trata de ficção policial, está mesmo. Pois o que a equipa da M6 mostra aqui é que não sabe manipulá-los. Ora, por muito que nos seja agradável escutar a língua francesa na nossa televisão generalista, tão ela cheia de inglês e das suas muitas variantes, é difícil dissociar esse fracasso da tentativa de fazer “à americana”, misturando Desperate Howsewives, 24, Nip Tuck e sabe-se lá mais o quê num seriado apenas.
Mas porque é que a ficção francesa precisa de fazer “à americana”, se ainda há pouco tempo era o mais sólido e respeitado contraponto ao império audiovisual de Hollywood?
CRÍTICA DE TV ("Crónica TV"). Diário de Notícias, 19 de Fevereiro de 2010