O primeiro mérito de Capadócia, a nova série da HBO cuja exibição acaba de arrancar no Fox Crime, não é centrar-se em belas mulheres hispânicas, seguindo a obsessão que Jennifer López, Eva Longoria e Rosario Dawson lançaram. O seu primeiro mérito é decorrer numa prisão mexicana e ser falada em espanhol, levando o México aos EUA (e os EUA ao México) e contribuindo para o combate àquele que, no limite, é o maior handicap do Ocidente no combate ao terror global: o etnocentrismo americano.
E, no entanto, os seus méritos vão além disso. Perdidos no meio das rebuscadíssimas soluções formais em que os produtores da TV americana vêm mergulhando, sabe-nos bem encontrar, aqui e ali, uma série de roupagens mais clássicas. Ora, Capadócia não se centra em personagens com dons “psíquicos”, em odisseias cuja acção se concentra num espaço de 24 horas ou em gente que teve um desastre de avião e foi parar a uma ilha. Centra-se numa prisão de mulheres apenas – e, se é difícil imaginar que um dia possamos ter um acidente de avião e sobreviver, a verdade é que a linha que diariamente nos separa de uma prisão é, bem vistas as coisas, bastante ténue.
O resultado não tem talvez a sofisticação de Lost ou Prision Break, mas vai muito além do que a HBO Latin America conseguira com Mulheres Assassinas ou Mandrake, ganhando outra acuidade na conquista do público americano. Além disso, uma história mexicana distribuída mundialmente com selo americano é mais do que apenas uma jogada de expansão mercantil por parte da HBO: é um salto importante no domínios de uma globalização equilibrada. Ah, sim: e as mulheres são lindas. Porque é que isso haveria de ser um defeito?
CRÍTICA DE TV ("Crónica TV"). Diário de Notícias, 5 de Fevereiro de 2010