Pouco importa se o UFC, ou Ultimate Fighting Championship, é sancionado pelas americanas State Athletic Commissions (que, aliás, apenas foram criadas para sancionar o insancionável). O UFC é um espectáculo degradante, que não devia ter lugar na televisão. Nem sequer nas madrugadas da SIC Radical espaços onde a degradação, mais ou menos estilizada, sempre desempenhou papel de destaque.
Houve um tempo em que muitos jornais se recusavam a publicar notícias sobre o boxe, sublinhando a sua violência e ignorando assumidamente a sua nobreza. Ainda hoje, aliás, o livro de estilo do El Pais declara que “a linha editorial do jornal é contrária ao fomento do boxe”, renunciando o diário madrileno a publicar “notícias que possam contribuir para a sua difusão” – e muitos foram os que lamentaram o contra-senso recente de o jornal oferecer o DVD de Million Dollar Baby, de Clint Eastwood, aos seus leitores.
Pois, ao pé do UFC – como ao pé do vale tudo brasileiro, a primeira inspiração da coisa –, uma transmissão televisiva de boxe parece um programa da Baby TV. No UFC, vale mesmo quase tudo: pontapés e cotoveladas, fazer sangrar o adversário, sangrar para cima dele durante meia hora e continuar a espancar violentamente um homem mesmo depois de ele estar dominado, prostrado no chão ou, até, num estado de semi-inconsciência.
No ano passado, o lutador texano Sammy Vasquez foi directamente do ringue para a morgue. O que muitos estranham é que apenas agora tenha ocorrido uma morte. E o que eu estranho é que os pais portugueses permitam aos filhos oferecer à iniciativa da SIC Radical as audiências necessárias para o canal continuar com ela.
CRÍTICA DE TV ("Crónica TV"). Diário de Notícias, 10 de Janeiro de 2010