
Já tive, em relação a isso, uma posição muito mais radical do que tenho hoje. Hoje acho que, na verdade, é bom que assim seja – e, se me calha escutar um relato em que o narrador grita com a mesma ênfase os golos portugueses e os golos estrangeiros, já estranho. Como escreveu um dia o Estadão, “das coisas menos importantes do mundo, o futebol é a mais importante”. Por outro lado, permanece no grupo das menos importantes. É uma coisa lúdica, deve continuar a ser uma coisa lúdica – e muito mal vamos todos nós, como aliás nos mostra a experiência, quando deixa de ser uma coisa lúdica.
Os high-fives de Sousa Martins a Ronaldo e Coentrão já são outra coisa. Na segunda-feira, e mal terminou o Portugal-Cabo Verde, o jornalista da TVI recebeu os jogadores na flash interview com uma euforia e uma cumplicidade tão grandes que até a eles surpreendeu. Com isso não quis ser irónico (deixando claro que o futebol é uma coisa lúdica) nem quis ser subserviente (seduzindo os jogadores para um suposto privilégio à TVI nas entrevistas). Quis apenas deixar claro que a TVI também é parte da comitiva, parte da festa, representante de todos nós. E resultou ridículo.
CRÓNICA DE TV ("Crónica TV"). Diário de Notícias, 26 de Maio de 2010