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31 Julho 2009

Há algo de constrangedor nisto de chegar ao século XXI e encontrar o wrestling a viver um dos seus melhores períodos de sempre. Como desporto, é uma tontice: uma abrutalhada coreografia levada a cabo por uma série de orangotangos que fingem andar à pancada, enquanto se esforçam por cumprir o plano onde se definiu quem ganha, quem perde e quantas bofetadas leva cada um. Como espectáculo, é pior ainda: uma paupérrima encenação protagonizada por uma série de péssimos actores incapazes de convencer quem quer que seja da autenticidade da sua luta.
E, no entanto, aí está ele, tão pujante como nos tempos de Tarzan Taborda: salas cheias, público delirante, mega produções, transmissão para os quatro cantos do mundo (incluindo Portugal, via Eurosport 2 e SporTV 3). Por causa da pancadaria? Em parte. Mas também, provavelmente, por causa da personalização de que foi alvo. Quem quer que vivesse na ilha Terceira dos anos 80 se lembra de ver wrestling no canal americano. Ora, nos anos 80, década de “A Fogueira das Vaidades, todos os lutadores eram máquinas (exactamente como os yuppies). Hoje, década de “Eu Sou a Charlote Simmons”, é tudo pessoal: todos os lutadores têm contas a ajustar com toda a gente – e as entrevistas, as conferências de imprensa e as apresentações dos combates são mais importantes do que a própria luta.
A única forma de explicar o wrestling é como um sinal dos tempos. E depois varrer tudo para debaixo do tapete.

CRÍTICA DE TV ("Crónica TV"). Diário de Notícias, 31 de Julho de 2009

publicado por JN às 09:15

29 Julho 2009

O episódio gerado estes dias em torno de José Augusto Marques e Jorge Baptista, narrador e comentador destacados pela SIC para o Benfica-Atlético de Madrid da semana passada, é deplorável. Deplorável, em parte, pela substância: tanto um como outro deixam clara a inveja em relação ao protagonismo de João Malheiro. E deplorável, no resto, pela própria existência do caso, originado pela vingança daqueles que decidiram defender Malheiro através da exposição pública de uma conversa privada.
Os palavrões não interessam. O marialvismo ainda menos. Onde quer que haja dois homens sozinhos e duas loiras desfilando em frente, as possibilidades de haver marialvismo e palavrões são grandes (em todas as actividades, em todas as classes sociais, em todas as idades). O que esta história nos mostra, principalmente, é que o YouTube precisa de regulação. E que, enquanto ninguém o regular, crimes como este (o da exposição de uma conversa privada, entre outros) continuarão a ser praticados todos os dias um pouco por todo o mundo.
De resto, apenas ficámos a saber que, entre os jornalistas que acompanham o futebol, grassam a inveja para com qualquer esboço de êxito por parte de outros e o ressentimento para com as condições de trabalho de que se dispõe. O que seria novidade se não fosse assim entre os restantes jornalistas também. E, aliás, entre os advogados, os médicos, os ladrilhadores e as lavadeiras do rio.

CRÍTICA DE TV ("Crónica TV"). Diário de Notícias, 29 de Julho de 2009

publicado por JN às 09:18

27 Julho 2009

Se uma coisa foi decisiva para a consagração de Friends como a mais longa sitcom de sempre, com dez imensas temporadas (e reposições que duram até hoje), foi o facto de os seis actores principais se terem efectivamente tornado amigos. Ainda há dias um documentário do canal E! o mostrava: tornando-se amigos, David Schwimmer, Jennifer Aniston, Matthew Perry, Courteney Cox, Lisa Kudrow e Matt LeBlanc conseguiram pressionar a NBC a pagar-lhes o que mereciam e, ao mesmo tempo, transportar para o ecrã uma química talvez nunca antes (ou depois) vista em televisão.
A norte-americana TV Guide considerou-a a segunda melhor série de TV de sempre, atrás apenas de Seinfeld. Tontice: Friends foi sempre melhor do que Seinfeld. Por uma razão simples: embora fosse Seinfeld a reclamá-lo, era em Friends que personagens e actores se confundiam. As histórias, no fundo, eram o menos. Como Rachel, Jennifer Aniston era tão superficial que casou com Brad Pitt. Como Monica, Courteney Cox era tão casadoira que, quando se uniu a David Arquette, passou a assinar Courteney Cox Arquette. Como Chandler, Matthew Perry era tão dado a vícios que chegou a andar em reabilitação. Como Joey, Matt LeBlanc era tão falhado como actor que o spin off baseado na sua personagem, Joey, acabou cancelado.
Nestes tempos sem chama, voltar a ver Friends (Sony Entertainment) é um dos poucos programas que apetece. Até porque, se há uma coisa essencial entre amigos, é a eterna repetição das histórias do passado.

CRÍTICA DE TV ("Crónica TV"). Diário de Notícias, 27 de Julho de 2009

publicado por JN às 09:20

25 Julho 2009

Hannah Montana: O Filme está, curiosamente, no extremo oposto de Hannah Montana, a série. Na televisão, Miley Cirus é uma raparigas igual às outras, mas é uma estrela. No cinema, Miley Cirus é uma estrela, mas é uma rapariga igual às outras. Numa adversativa bem feita, a ordem dos “adversos” faz toda a diferença. O filme, que por esta altura está em exibição um pouco por todos os cinemas nacionais, é melhor do que a série.
E não por causa da qualidade dos planos, das interpretações, dos décors, dos efeitos especiais, da iluminação. Hannah Montana: O Filme é melhor por causa do dilema em torno do qual gravita o argumento: uma jovem estrela é obrigada a regressar à cidadezinha rural de onde provém – e, em consequência disso, a redescobrir a vida com outro tipo de liberdade. Moralista? Claro. E porque não? Neste mundo, a ciência explica-nos como fazer, mas não nos diz “se” devemos fazê-lo – e, já não tendo Deus, não nos resta outra arma se não a moral.
O mais curioso, porém, é que esta reordenação de valores em Hannah Montana ocorra precisamente agora, numa altura em que a série se encontra já com apenas cerca de 45% das audiências que chegou a ter. No ano passado, quando a resposta do público ainda era outra, o filme-concerto Hannah Montana e Miley Cyrus: O Melhor dos Dois Mundos revelou-se bem menos preocupado ou comprometido. Na ficção para crianças, é assim mesmo: primeiro a diversão, depois a obrigação. O que, diga-se, está certíssimo.

CRÍTICA DE TV ("Crónica TV"). Diário de Notícias, 25 de Julho de 2009

publicado por JN às 09:21

21 Julho 2009

Há um momento exemplar na primeira edição de “Há Festa Em…”. José Carlos Malato faz uma pergunta a uma concorrente (qualquer coisa sobre o nome que se dá a um homem atraído por várias mulheres, confesso que me escapou a formulação) e esta começa a hesitar na reposta. “Diz”, insiste Malato. “Não posso”, responde a concorrente. Era uma brejeirice – e, ao perceber que era uma brejeirice, o apresentador cai em cima dela: “Diz! Diz! Diz!” Só falta ralhar-lhe: “É para isso que estás aqui, pá!” E, naturalmente, a rapariga diz.
A nova aposta da RTP para os domingos à noite não é uma decepção nem uma surpresa. É o que se esperava a partir do momento em que os spots de promoção começaram a ser emitidos: tonto, brejeiro e globalmente fraco. Tem algo de “Jogos Sem Fronteiras” e outro tanto de “Não Te Esqueças da Escova de Dentes”, aquele programa em que Teresa Guilherme punha os concorrentes a mexer em lagartos em troca de uma viagem à Madeira. José Carlos Malato e Fernando Mendes tratam toda a gente por tu, o que será talvez a única curiosidade. No resto, grita-se “Apalpa! Apalpa! Apalpa!” como noutros programas se grita(va) “Despe! Despe! Despe!” O facto de ambos os apresentadores serem gordos é o principal mote da encenação.
É pena. Porque Malato e Mendes sabem fazer melhor e porque a equipa da Fremantle também sabe. Pediram-lhes isto, provavelmente: brejeirice com fartura. “É assim o Verão”, diz-se. E eu acho que não tem de ser.

CRÍTICA DE TV ("Crónica TV"). Diário de Notícias, 21 de Julho de 2009

publicado por JN às 09:57

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joel neto

Joel Neto nasceu em Angra do Heroísmo, em 1974. Publicou “O Terceiro Servo” (romance, 2000), "O Citroën Que Escrevia Novelas Mexicanas” (contos, 2002), “Al-Jazeera, Meu Amor” (crónicas, 2003) e “José Mourinho, O Vencedor” (biografia, 2004). Está traduzido em Inglaterra e na Polónia, editado no Brasil e representado em antologias em Espanha, Itália e Brasil, para além de Portugal. Jornalista, tem trabalhado... (saber mais)
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